segunda-feira, 31 de março de 2025

Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I

Da nobreza da alma

A Modéstia é uma das formas de demonstrar a nobreza da alma
A Modéstia é uma das formas de demonstrar a nobreza da alma

Fili, in mansuetudine serva animam tuam, et da illi honorem secundum meritum suum – “Filho, guarda a tua alma na mansidão, e dá-lhe honra segundo o seu merecimento” (Ecle 10, 31)

Sumário. A nossa alma é, sem dúvida, mais preciosa do que todos os bens do mundo, não só pela sua nobre origem, senão também, e muito mais, pelo preço do seu resgate e pela sublimidade do seu destino. Por isso o demônio estima-a tão alto, que para se apoderar dela não descansa. Ora dize-me: se o inimigo vela sempre para perder a nossa alma, como podemos nós ficar dormindo o sono da tibieza?

I. Devemos considerar bem que o negócio da nossa eterna salvação é um negócio das mais graves consequências, porque se trata da alma, e, tendo-se perdido esta, tudo está perdido. A alma, diz São João Crisóstomo, deve ser tida por nós como mais preciosa que todos os bens do mundo. E, para compreender esta verdade acrescenta São Eleutério, se não nos basta saber que Deus a criou à sua imagem e semelhança, seja-nos ao menos suficiente saber que Jesus Cristo pagou um preço de valor infinito para remir a alma da escravidão do demônio: Si non credis Creatori, interroga Redemptorem — “Se não acreditas no Criador, interroga ao Redentor”.

Assim é: para salvar nossas almas, o próprio Deus sacrificou seu Filho à morte; e o Verbo eterno não duvidou resgata-las a troco de seu sangue. Empti enim estis pretio magno (1) — “Fostes comprados por alto preço”. Pelo que um santo Padre, considerando o preço do resgate humano, chega a dizer: Parece que o homem vale tanto como Deus. — Tinha muita razão São Filipe Neri de tratar pela salvação da alma. Se tem tamanho valor a nossa alma, que bens do mundo poderemos dar em troca, se viermos a perdê-la? Quam dabit homo commutationem pro anima sua? (2) — “Que dará o homem em troca da sua alma?”

Se houvesse na terra homens mortais e outros imortais, e se os mortais vissem os imortais preocupados com as coisas do mundo, procurando granjear honras, bens e prazeres mundanos, dir-lhes-iam sem dúvida: Quanto sois insensatos! Podeis adquirir bens eternos e pensais nessas coisas miseráveis e passageiras? E é por elas que vos condenais a penas eternas na outra vida? Deixai esses bens terrestres para aqueles que, como nós, tudo vem acabar com a morte. Mas não! Todos somos imortais. Como é então que tantas pessoas perdem a alma em troca das miseráveis satisfações deste mundo?

II. Devemos de hoje em diante empregar toda a diligência na salvação da nossa alma, e por isso devemos fugir das ocasiões perigosas, resistir às tentações e frequentar os sacramentos. Vede, diz Santo Agostinho; o demônio estima tanto uma alma, que para se apoderar dela, não dorme, mas anda continuamente ao redor de nós buscando perdê-la. Ora, se o inimigo vela sempre para a nossa perdição, havemos de ficar dormindo o sono da tibieza? Vigilat hostis, dormis tu?

Ah, meu Deus! De que serviram os longos anos que me haveis dado para adquirir a salvação eterna? Vós, ó Redentor meu, resgatastes a minha alma à custa do vosso sangue e ma destes para trabalhar pela sua salvação, e eu não trabalhei senão para perdê-la, ofendendo-Vos a Vós, que tanto me haveis amado. Agradeço-Vos o tempo que ainda me concedeis para reparar tão grande perda. Perdi a alma e a vossa amável graça!

Senhor, arrependo-me e sinto-o de todo o coração. Ah, perdoai-me, pois que d’oravante estou resolvido a perder todos os bens, incluindo a vida, antes que perder a vossa amizade. Amo-Vos sobre todas as coisas e tenho a firme vontade de Vos amar sempre, ó Bem supremo, digno de todo o amor. Ajudai-me, ó meu Jesus, a fim de que esta resolução não seja semelhante às outras que formei no passado e que foram outras tantas infidelidades. Deixai-me antes morrer do que tornar a ofender-Vos e deixar de Vos amar.

— Ó Maria, esperança minha, salvai-me, obtendo-me a santa perseverança.

Referências:

(1) 1Cor 6, 20
(2) Mt 16, 26

(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I: Desde o Primeiro Domingo do Advento até a Semana Santa Inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 362-364)

Santo do dia

O bem, dizem os filósofos, é expansivo por natureza. É por isso que os santos se fazem apóstolos do bem e da verdade: a sua boca fala do que está cheio o seu coração. O que temos em nós que nunca falamos de Deus?

 1 de abril: São Hugo, Bispo de Grenoble (1053-1132)


São Hugo nasceu em Châteauneuf-d'Isère, perto de Valence, em Dauphiné. Enquanto sua mãe o carregava em seu ventre, ela teve um sonho no qual parecia dar à luz uma linda criança que São Pedro, acompanhado por outros santos, levou ao Céu e apresentou diante do trono de Deus. Esta visão foi para seus pais um presságio de destinos elevados e sagrados; Eles também cuidaram de sua educação e não hesitaram em incentivar sua vocação eclesiástica.


Escolhido, ainda jovem, pelo Bispo de Valence para ser cônego de sua catedral, viu-se, aos vinte e sete anos, obrigado a aceitar a sede episcopal de Grenoble, que havia ficado vaga. Ele desejava receber a unção episcopal das mãos do Papa Gregório VII, que, conhecendo de antemão seus méritos e virtudes, lhe revelou toda a sua alma e lhe inspirou um ardente zelo pela liberdade da Igreja e pela santificação do clero.


Hugo encontrou seu bispado no mais lamentável estado; todos os abusos da época reinavam supremos ali. O novo Pontífice fez esforços incríveis para reavivar a fé e elevar os costumes; sendo infrutíferos seus esforços, decidiu abandonar seu cargo e refugiou-se no mosteiro de Chaise-Dieu; mas logo o Papa, informado do que estava acontecendo, ordenou-lhe que retornasse ao seu bispado e preferisse a salvação das almas ao seu repouso pessoal.


Foi nos anos seguintes que São Bruno fundou em sua diocese a admirável instituição da Cartuxa. Hugo ia frequentemente a este eremitério e viveu com os cartuxos como o último deles; sua atração pela solidão era tão forte que ele não conseguia sair daquele retiro austero, e Bruno se viu obrigado a dizer-lhe: "Vá até seu rebanho; ele precisa de você; dê a ele o que você deve."


Contudo, Hugo, pelo poder de sua santidade, operou grande bem nas almas; sua pregação veemente comoveu multidões e tocou corações; No confessionário, ele frequentemente chorava com seus penitentes e os estimulava a uma maior contrição. Depois de alguns anos de episcopado, sua diocese mudou de rosto.


Entre suas grandes virtudes, sua modéstia e caridade eram particularmente notadas. Duro consigo mesmo, ele era generoso com os pobres e chegou ao ponto de vender seu anel e cálice por eles. Ele sempre demonstrou uma energia indomável na defesa dos interesses da Igreja; Ele sempre permanecerá como um dos belos modelos de nobre independência e coragem orgulhosa. Seu exemplo também nos ensina que, se a salvação das almas é algo inestimável, muitas vezes ela só acontece à custa de longa perseverança e grande abnegação.

Catedral de Notre-Dame de Grenoble (França)


Santo do dia


31 de março: São Benjamim, Mártir.


São Benjamim, Diácono e Mártir. Nasceu no ano de 394 na Pérsia, e ao ser evangelizado, começou a participar da Igreja ao ponto de descobrir sua vocação ao diaconato. Serviu a Palavra e aos irmãos na caridade, chamando a atenção de muitos para Cristo.
  Chegou a ser preso por um ano, sofrendo, e se renunciasse ao nome de Jesus, seria solto. Porém, mesmo na dor, na solidão e na injustiça, ele se uniu ainda mais ao Cristo crucificado. Foi solto com a ordem de não falar mais de Jesus para ninguém, o que era impossível, pois sua vida e seu serviço evangelizavam.
  Benjamim foi canal para que muitos cegos voltassem a ver, muitos leprosos fossem curados e assim muitos corações duvidosos se abriram a Deus. Foi novamente preso, levado a publico e torturado para que renunciasse à fé. Perguntou então ao Rei, se gostaria que algum de seus súditos fosse desleal a ele. Obviamente que o rei disse que não. E assim o diácono disse que assim também ele, não poderia renunciar a sua fé, a seu Rei, Jesus Cristo. E por não renunciar a Jesus, foi martirizado. Isso no ano de 422.

Santo do dia

Nosso Senhor Jesus Cristo, ao recomendar-nos a simplicidade da pomba, quer também que sejamos prudentes como as serpentes. A verdade é frequentemente prejudicada ao fazer coisas que ela não ordena. Não há autoridade que nos impeça de cumprir com nosso dever. Devemos obedecer a Deus antes que aos homens.


 31 de março: São Nicolau de Flüe, eremita na Suíça ( 1417-1487 )


São Nicolau de Flüe nasceu na Suíça de pais piedosos. Um dia, ao avistar uma torre esbelta em uma montanha próxima, ele foi tomado pelo desejo do Céu e pelo amor à solidão. Ele se casou em obediência aos desejos formais de seus pais e teve dez filhos. Seu mérito e virtude fizeram com que fosse escolhido pelos seus concidadãos para exercer funções públicas muito honrosas.


Sua oração habitual era esta: "Meu Senhor e meu Deus, tira de mim tudo o que me impede de vir a Ti. Meu Senhor e meu Deus, dá-me tudo o que pode me atrair a Ti."


Ele tinha cinquenta anos quando uma voz interior lhe disse: "Deixe tudo o que você ama, e Deus cuidará de você." Ele teve que enfrentar uma luta difícil, mas decidiu deixar tudo, esposa, filhos, casa, terras, para servir a Deus. Ele se afastou, descalço, vestido com uma longa túnica de saco, um rosário na mão, sem dinheiro, sem provisões, lançando um último olhar terno e demorado para sua família.


Certa noite, Deus o penetrou com uma luz brilhante e, daquele momento em diante, ele nunca mais sentiu fome, sede ou frio. Tendo encontrado um lugar selvagem e solitário, ele se hospedou lá em uma cabana de folhas e depois em uma cabana de pedra. A notícia de sua presença logo se espalhou, e uma grande multidão se reuniu ao seu redor. Incrivelmente, o santo eremita viveu dezenove anos somente da Sagrada Eucaristia; As autoridades civis e eclesiásticas, informadas do fato, mandaram vigiar sua cabine e constataram o prodígio de forma indubitável.


A Suíça, antes dividida, teve sua independência ameaçada pela Alemanha. Nicolau de Flüe, venerado por todos, foi escolhido como árbitro e falou tão sabiamente que a união foi feita, para alegria comum, e a Suíça foi salva. Sinos tocaram por toda a terra, e o coro de júbilo ecoou pelos lagos, montanhas e vales, desde o vilarejo mais humilde até as maiores cidades.


Nicolau foi acometido, aos setenta anos, por uma doença muito aguda que o atormentou por oito dias e oito noites sem lhe tirar a paciência.


Túmulo de São Nicolau de Flüe, igreja paroquial de Sachseln (Suíça)


domingo, 30 de março de 2025

Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I

 Meios para alcançar o amor de Deus e a santidade

Carregando Cruz

Desideria occidunt pigrum… qui autem iustus est tribuet, et non cessabit “Os desejos matam o preguiçoso; porém, o que é justo dará e não cessará” (Pv 21, 25-26)

Sumário. Quem quiser ser santo não se deve contentar com o desejo, mas deve resolver-se a por depressa mãos à obra, porque o demônio não teme as almas irresolutas. Os meios para chegar a um fim tão sublime, são particularmente dois: a oração, que faz o amor divino entrar no coração, e a mortificação, que dele remove a terra e o torna apto a receber o fogo divino. Ganhemos ânimo; comecemos desde já a empregar estes meios e nós também chegaremos a ser santos.

I. Quem mais ama a Deus é mais santo. Dizia São Francisco Borges que a oração faz entrar o amor divino no coração, ao passo que a mortificação dele remove a terra e fá-lo apto a receber aquele fogo sagrado. Quanto mais espaço a terra ocupa no coração, tanto menos lugar achará ali o santo amor: Sapientia… nec invenitur in terra suaviter viventium (1) — “A sabedoria… não se acha na terra dos que vivem em delícias”. — Por isso é que os Santos sempre procuraram mortificar, o mais possível, o seu amor próprio e os seus sentidos. “Os santos são poucos, mas devemos viver com os poucos, se nos quisermos salvar com os poucos”, escreve São João Clímaco: Vive cum paucis, si vis regnare cum paucis. E São Bernardo diz:

“Quem quer levar vida perfeita, deve levar vida singular: Perfectum non potest esse nisi singulare.”

Para sermos santos, devemos, antes de mais nada, ter o desejo de nos tornarmos santos: desejo e resolução. Alguns sempre desejam, mas nunca começam a por mãos à obra. “De semelhantes almas irresolutas”, dizia Santa Teresa, “o demônio não tem medo. Ao contrário, Deus é amigo das almas generosas.”

É, pois, um engano do demônio, no dizer da mesma seráfica Santa, fazer-nos pensar que há orgulho em se querer tornar santo. Seria orgulho e presunção se metêssemos a nossa confiança em nossas obras ou resoluções; mas não, se esperamos tudo de Deus, que então nos dará a força que nos falta. — Desejemos, portanto, e ardentemente, chegar a um grau sublime de amor divino e digamos com coragem: Omnia possum in eo qui me confortat (2) — “Eu posso tudo naquele que me fortalece”. Se não achamos em nós tão grande desejo, peçamo-lo instantemente a Jesus Cristo, que não deixará de no-lo dar.

II. Devemo-nos, portanto, alentar, tomar uma resolução e começar; lembrando-nos de que, na perfeição cristã, segundo a expressão de São Francisco de Sales, vale muito mais a prática do que a teoria. O que não podemos fazer com as nossas próprias forças, ser-nos-á possível com o auxílio de Deus, que prometeu dar-nos tudo o que Lhe pedíssemos: Quodcumque volueritis, petetis, et fiet vobis (3).

Ó meu amado Redentor, Vós desejais o meu amor e me mandais que Vos ame de todo o coração. Sim, Jesus meu, quero amar-Vos de todo o meu coração. Não, meu Deus — assim Vos direi, confiado em vossa misericórdia, — não me assustam os pecados que cometi, porque agora detesto-os e abomino-os mais do que qualquer outro mal, e sei que Vos esqueceis das ofensas da alma que se arrepende e Vos ama. Porque Vos ofendi mais do que os outros, quero, com o auxílio que de Vós espero, amar-Vos mais do que os outros.

Senhor meu, Vós me quereis santo, e eu quero tornar-me santo, não tanto para gozar no paraíso, como para Vos agradar. Amo-Vos, bondade infinita! † Jesus, meu Deus, amo-Vos sobre todas as coisas, e me consagro todo a Vós, vós sois o meu único bem, o meu único amor. Aceitai-me, ó meu amor, e fazei-me todo vosso, e não permitais que ainda Vos dê desgosto. Fazei com que eu me consuma todo por Vós, assim como Vós Vos consumistes todo por mim. — Ó Maria, ó Esposa mais amável do Espírito Santo, e a mais amada, obtende-me amor e fidelidade. Alcançai-me somente, ó minha Mãe, que eu seja sempre vosso devoto servo; porquanto quem se distingue na devoção para convosco, distingue-se também no amor a vosso divino Filho.

Referências:

(1) Jó 28, 13
(2) Fl 4, 13
(3) Jo 15, 7

(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I: Desde o Primeiro Domingo do Advento até a Semana Santa Inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 360-362)

Socorro às santas almas



Motivos pelos quais devemos
socorrer as almas do Purgatório


1º - O serviço que prestamos a Deus e a glória que lhe proporcionamos


Imaginemos o que experimentaria o coração de uma mãe que, tendo conhecimento de que seu filho foi condenado à prisão por muitos anos, o visse de repente, trazido por um amigo que o ajudou a se libertar. E ainda, a glória que lhe proporcionamos, pois fomos criados para glorificar a Deus, e cada alma liberta do Purgatório, imediatamente voa ao Céu e glorifica incessantemente ao Senhor Deus Todo Poderoso.


2º - O serviço que prestamos a nós mesmos


Adquirimos certamente um protetor no Céu, as almas por nós ajudadas a se libertarem serão eternamente reconhecidas no Céu. No Céu também se ama e se é reconhecido. Constituímos no Céu um representante nosso que, em nosso nome, adora, louva e glorifica o Senhor, enquanto estamos em vida ocupados em trabalhos e fadigas, elas adoram a Deus também em nosso nome.


"Tudo quanto peço a Deus pela intercessão

das almas do Purgatório me é concedido".

Santa Teresa


"Quando quero obter com segurança uma graça, 

recorro às almas padecentes e a graça que suplico sempre me é concedida"

Santa Catarina de Bolonha


3º - As principais virtudes que assim praticamos


Socorrendo as almas do Purgatório praticamos a caridade em toda sua extensão. Ajudamos ao nosso próximo no dia-a-dia, em diversas circunstâncias, também devemos fazê-lo às almas do Purgatório, e ainda mais, porque sabemos que não podem socorrer a si mesmas.


4º - O julgamento que nos espera após a morte


É obra de caridade rezar por quem precisa. "Tudo que fizerdes aos meus pequeninos e a mim que o fazeis". Nos disse o Senhor Jesus. E ainda "Tudo o que damos por caridade às almas do Purgatório converte-se em graças para nós, e, após a morte, encontramos o seu valor centuplicado". Nos ensinou Santo Ambrósio Nós podemos rezar por nós e por elas, e as almas do Purgatório não podem se ajudar. Nós podemos pagar as suas dívidas, para que alcancem a liberdade. E ainda, não podemos nos esquecer de que um dia poderemos estar no Purgatório.


O que nos leva ao Purgatório?

A Tibieza e o Pecado Venial


“A tibieza é o hábito não combatido do pecado venial, ainda que seja um só.”

Santo Afonso


A tibieza mina o espírito, sem que as pessoas percebam, nos enfraquece espiritualmente, amortece as energias da vontade e do esforço. Afrouxa a vida cristã. É um sistema de acomodações na vida espiritual do cristão. Há muitos sinais de tibieza, mas o que a caracteriza é o pecado venial deliberado e habitual. Tudo quanto ofende a Nosso Senhor nunca é leve ou coisa sem importância para uma alma fervorosa. O pecado venial é uma ofensa a Deus, e nele há:


Três circunstâncias agravantes:


1. 1- Uma injúria a Majestade Divina.

2-Revolta contra a Autoridade de Deus

3-Ingratidão a Bondade Eterna.


"O hábito dos pecados veniais tira dos nossos olhos 

a malícia do pecado grave, e em breve não receamos 

passar das faltas mais leves aos maiores pecados".

São Gregório


“Depois da morte, as menores penas que nos esperam é algo maior 

do que tudo que se possa padecer neste mundo. 

As menores faltas são punidas severamente”.

Santo Anselmo 


O que devemos fazer?

Eis as palavras de Santo Agostinho:


Devemos, pois socorrer os falecidos: Em razão do parentesco de sangue. Por gratidão, aos benfeitores nossos. Por justiça. Por caridade.


O Santo Cura d’Ars, São João Batista Vianney, era um devoto fervoroso das almas do Purgatório. Pedira a Deus a graça de sofrer muito. Os sofrimentos do dia, oferecia-os pela conversão dos pecadores, e os da noite, pelas almas do Purgatório.


"Se soubéssemos como é grande o poder das boas almas do Purgatório 

(em nosso favor) sobre o Coração de Jesus, 

e se soubéssemos também quantas graças 

poderíamos obter por intercessão delas,

é certo, não seriam tão esquecidas".

São João Batista Vianney



Como podemos ajudá-las?

Um dia, Santa Gertrudes rezava com fervor pelos falecidos, quando Nosso Senhor lhe fez ouvir estas palavras:


"Eu sinto um prazer todo especial pela oração que me fazem pelos fiéis defuntos, principalmente quando vejo que a compaixão natural se junta a boa vontade de a tornar mais meritória. A oração dos fiéis desce a todo instante sobre as almas do Purgatório, como um orvalho refrigerante e benéfico, como um bálsamo salutar que adoça e acalma suas dores, e ainda as livra das suas prisões mais ou menos rapidamente conforme o fervor da devoção com que é feita".


E ainda noutra ocasião:

"Muitíssimo grata me é a oração pelas almas do Purgatório, porque por ela tenho ocasião de libertá-las das suas penas e introduzí-las na glória eterna".


Oração

Aplicando as indulgências recebidas na oração em sufrágio, para a liberdade das almas do Purgatório.


Aqui vemos a importância das indulgências, através delas pagamos à Justiça Divina o que devemos, ou as oferecemos pelas almas para que elas possam assim pagar o devem à Justiça Divina, e se libertarem para entrar no gozo Celeste.


Salmo De Profundis

É um dos sete Salmos Penitenciais, e é uma oração indulgenciada.

Orações canônicas do Breviário ou Divino Ofício, Orações Oficiais da Igreja


"A oração é a chave de ouro que abre o Céu".

Santo Agostinho


Sofrimento

"Aliviemos as almas do Purgatório, aliviemo-las por tudo o que nos penaliza,

porque Deus tem cuidado em aplicar aos mortos os méritos dos vivos".

São João Crisóstomo


Podemos aceitar os nossos sofrimentos com amor e humildade, oferecendo-os em sacrifício pelas almas, afim de que elas sofram menos. É meritório para nós (santificação) e para as almas (alívio dos sofrimentos) oferecer a Nosso Senhor Jesus Cristo a cruz de cada dia pelos nossos falecidos. Quem não tem a sua cruz?


É bom lembrar que, aceitando os sofrimentos da vida, em espírito de reparação, estaremos diminuindo as penas que poderemos experimentar se formos para o Purgatório. Não sabemos o nosso futuro.


Ato Heróico

Quando fazemos um ato de penitência e oração, como por exemplo rezar um Santo Terço de joelhos, há neste ato, três frutos diferentes: Um fruto meritório – que não o podemos perder, é o mérito pessoal de quem o pratica, nos dá um acréscimo de graça e de glória. Um valor satisfatório do ato – que é a penitência, o sacrifício, e este é para as almas, no Ato Heróico. Uma força impetratória - que é a da oração como oração.


"É o ato que consiste em oferecer à Divina Majestade, em proveito das almas do Purgatório, todo o valor satisfatório das obras que fizemos durante a vida, e todos os sufrágios que forem aplicados pela nossa alma depois da morte". Este ato há de ser feito em perpétuo, isto é, por toda a vida continuando após a morte, mas não obriga sob pena de pecado, a pessoa pode renunciá-lo, não comete pecado mortal nem venial. Pelo Ato Heróico não renunciamos o mérito de nossas boas obras, isto é o fruto meritório, que nos dá nesta vida um acréscimo da graça e da glória no Paraíso. Este merecimento é nosso e não o podemos ceder aos outros.


Além disso, tudo o mais que fizermos, será em proveito das almas do Purgatório, desde que fazemos o Ato Heróico, todas as indulgências que lucramos são das almas. Só a indulgência plenária na hora da morte não é aplicável aos falecidos. O Ato Heróico não impede de rezar nas próprias intenções e pelos falecidos.


O Ato Heróico não nos impede de utilizar a força impetratória da oração por alguma alma em particular, mas a entrega que se faz em favor das almas sofredoras neste ato, no qual cedemos o valor satisfatório, é feito, em geral, por todas as almas, e não em favor de uma ou outra em particular.


É um engano pensar que se perde muito com o Ato Heróico, ao contrário, lucra-se mil vezes mais. Deus se deixa vencer em generosidade? Este Ato é cheio de mérito, é um ato perfeito, que nos faz esquecer de nós mesmos para favorecer nossos irmãos e praticar a caridade. "A caridade cobre uma multidão de pecados", nos ensina a Palavra de Deus. Este heroísmo de caridade será recompensado com superabundância de graças em vida e de glória na eternidade.


Para realizá-lo, não é prescrita uma oração em especial, pode ser feito espontaneamente

sábado, 29 de março de 2025

Santo do dia

 Quando Deus deseja comunicar-se mais intimamente a uma alma e inundá-la com sua luz, ele normalmente a retira do meio do mundo e fala com ela na lembrança da solidão.

 

30 de março: São João Clímaco, abade (525-605)


O nome deste Santo vem do belo livro que ele compôs sob o título grego de Clímax ou Escada do Céu. A Palestina foi sua primeira estadia. Aos dezesseis anos, ele deixou o mundo para se entregar inteiramente a Deus em um mosteiro no Monte Sinai. Aos dezenove anos, o jovem monge, sob a orientação de um monge sagrado chamado Martyrius, trabalhou incansavelmente em direção à sua perfeição e fez um progresso tão rápido que surpreendeu seu próprio mestre.


Após a morte de seu mestre, João retirou-se para uma profunda solidão, a fim de levar uma vida ainda mais perfeita. Uma cruz de madeira, uma mesa feita de quatro tábuas rústicas e o livro da Sagrada Escritura, com algumas obras dos Santos Padres, formavam todo o mobiliário. Lá ele viveu por quarenta anos, uma vida de anjo e não de homem.


Desapegado do mundo, liberto, por assim dizer, do corpo pela mortificação, ele se elevava livremente a Deus, perdia-se em sublimes contemplações e conversava docemente com os anjos sobre os mistérios da fé. Seus dois olhos eram duas fontes de doces lágrimas que ele derramava no segredo da solidão. Ele gostaria de afogar em suas lágrimas todos os crimes da terra; ele também gemeu por seu longo exílio e suspirou pela Pátria celestial; mas na maioria das vezes suas lágrimas eram lágrimas de alegria, admiração e amor transbordante, excitadas pela contemplação das maravilhas divinas que lhe eram reveladas.


É surpreendente que, como um novo João Batista, ele tenha visto multidões se aglomerarem em sua volta para receber lições de penitência e vida cristã? Para cada um ele estabeleceu regras salutares; Sua bênção curou os doentes, fortaleceu os fracos, consolou os aflitos, tocou os teimosos e os converteu mais do que os raciocínios da ciência.


Grande era o poder de João Clímaco contra o demônio; ele sabia como derrotá-lo e desanimá-lo nas batalhas que teve que suportar dele; Ele também foi terrível para o inimigo da salvação, afastando-o das almas de seus irmãos. Um homem solitário chamado Isaac veio lançar-se a seus pés, suplicando-lhe que o livrasse das obsessões impuras com as quais o demônio o pressionava implacavelmente:


"A paz esteja com você, meu irmão!" disse o Santo. Com essas palavras, ele começou a orar com ele. O rosto do Santo resplandeceu com um brilho celestial que se espalhou por toda a caverna, e o demônio soltou rugidos terríveis. Depois que a oração terminou, Isaque se levantou em paz e liberto para sempre.


João Clímaco foi eleito, aos setenta e cinco anos, abade do Sinai, e tornou-se cada vez mais o anjo e oráculo do deserto até sua morte.


Torre do Sino de Ivan, o Grande e a Igreja de São João Clímaco em Moscou (Rússia)


  

São João Clímaco nasceu em 525. São João Clímaco foi um monge do Monte Sinai na Palestina, e deve o seu cognome a um livro seu, Escada (Klímax – Clímaco) dentro de uma família cristã que passou para ele muitos valores, possibilitando a ele uma ótima formação literária. A Escada é um resumo da vida espiritual, concebida para os solitários e contemplativos. Para São João Clímaco, a oração é a mais alta expressão da vida solitária; ela se desenvolve pela eliminação das imagens e dos pensamentos.
São João Clímaco desde cedo foi discernindo sua vocação à vida religiosa. Diante do testemunho de muitos cristãos que optavam por ir ao Monte Sinai, e ali no mosteiro viviam uma radicalidade, ele deixou os bens materiais e levou os bens espirituais para o Sinai. Ali, com outros irmãos, deixou-se orientar por pessoas com mais experiência, fazendo um caminho pessoal e comunitário de santidade.
Foi atacado diversas vezes por satanás, vivendo um verdadeiro combate espiritual.
São João Clímaco buscou corresponder ao chamado de Deus por meio de duras penitências, pouca alimentação, sacrifícios, intercessão e participação nas Santas Missas.

 Daí a necessidade da ‘monologia’, isto é, a invocação curta, de uma só palavra, incansavelmente repetida, que paralisa a dispersão do espírito. Essa repetição deve assimilar-se com a respiração.
Conta-se que ele era palestino e na adolescência ingressou em um mosteiro no Monte Sinai, onde passou a dedicar sua vida às orações e à meditação. Até os 35 anos viveu desta forma, mas quando seu mestre faleceu resolveu encerrar-se em uma cela e viver à moda dos monges do deserto: jejuando, orando e estudando a Bíblia.

Durante este novo período de sua vida São João Clímaco decidiu nunca mais comer carne, fosse ela vermelha ou branca. Também passou a sair de sua cela apenas para participar da Eucaristia, aos domingos.

Já com 70 anos foi eleito bispo do Monte Sinai, muito embora preferisse continuar com sua vida isolada. Nesta época construiu hospitais para a população mais pobre, ajudado pelo papa Gregório Magno.
https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjfKAFlks0FOOHEwcshdOqvMfOc2WCNgOiLPY5WscgAkx83oaQMtd47qDldJPa3ja6q-f1VHnIeRrxZV1D3RcMocSlgh0cJh9sVgx9DWFQoVZlkhjss4nDt4EwG-zVOFzZ1O9epdgDG2FyK/s1600/The+Ladder+of+Divine+Ascent.jpgO nome de São João Clímaco é uma alusão à palavra “klímax’, que em grego significa escada. São João decidiu adotar este nome em virtude do livro escrito nos últimos quatro anos de sua vida foram dedicados a viver como ermitão. Neste período de total isolamento ele escreveu por ele mesmo, intitulado Escada para o Paraíso contem princípios religiosos pequena regras da perfeição evangélica.

Nesta obra ele explica que existem 30 degraus a serem galgados para que possamos atingir a perfeição moral. Este livro foi um grande sucesso na época e chegou até mesmo a influenciar monges e outros religiosos em sua conduta particular, tanto no Ocidente como no Oriente. A importância desta obra literária para a época pode ser notada na utilização do símbolo escada na arte bizantina.

São João Clímaco foi muito famoso como homem santo em toda a Palestina e Arábia. Viveu por volta do ano 605 e morreu 80 anos no Monte Sinai.

Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I: Segunda Meditação para o 4º Domingo da Quaresma

 Terna compaixão de Jesus Cristo para com os pecadores

Cruz


Misereor super turbam – “Tenho pena deste povo” (Mc 8, 2)

Sumário. O nosso amantíssimo Redentor, movido de compaixão para com os pecadores, baixou do céu para salvá-los da morte eterna, à custa do seu sangue. Jesus Cristo declarou que Ele era aquele bom Pastor que tinha vindo à terra para dar vida a suas ovelhas. Que maior sinal de amor podia dar aos homens o Filho de Deus? Voltemo-nos com confiança para Jesus Cristo, se porventura o temos abandonado.

I. Diz-nos o Evangelho de hoje que achando-se Jesus num monte com os seus discípulos e uma multidão de povo que O acompanhava, compadeceu-se daquele povo faminto. Sabendo que um moço tinha cinco pães de cevada e dois peixes, tomou-os em suas mãos, e tendo dado graças, mandou distribuí-los. Todos comeram e encheram-se doze cestos com os pedaços que sobejaram. Fez o Senhor este milagre, movido da grande compaixão que teve de tantos pobres; mas muito maior é a compaixão que tem dos pobres de alma, os pecadores.

Movido o nosso amantíssimo Redentor da sua grande compaixão para com os homens que tristemente viviam sob a escravidão do pecado, baixou do céu à terra para salvá-los da morte eterna à custa do seu sangue. Por isso cantou Zacarias, pai de São João Batista: Per viscera misericordiae Dei nostri… visitavit nos oriens ex alto (1) — “Pelas entranhas misericordiosas de nosso Deus, visitou-nos o Sol nascido do alto”.

Jesus Cristo mesmo declarou depois, que Ele era aquele bom Pastor que tinha vindo à terra dar a salvação às suas ovelhas, que somos nós: Ego veni, ut vitam habeant et abundantius habeant (2) — “Eu vim para que as ovelhas tenham vida e a tenham em abundância”. Isso quer dizer que Jesus Cristo veio não só para nos fazer recuperar a vida perdida da graça, mas também para nos dar outra mais abundante e melhor do que a que perdemos pelo pecado.

São Leão diz que Jesus Cristo nos proporcionou maiores bens com a sua morte do que o demônio nos tinha trazido males por meio do pecado. Também o Apóstolo o deu claramente a entender por estas palavras: Quanto mais abundou o pecado, tanto mais superabundou a graça (3). Jesus Cristo mesmo disse que, embora bastasse uma gota do seu sangue, uma simples súplica sua para remir o mundo, não bastava porém para manifestar seu amor pelos homens. Eu sou o bom Pastor, diz Ele, e o bom Pastor sacrifica a sua vida pelas suas ovelhas (4).

II. Que maior sinal de amor podia dar aos homens o Filho de Deus, do que dar a vida por nós, que somos suas ovelhas?

Ó amor imenso de nosso Deus! — exclama São Bernardo, para perdoar aos servos, nem o Pai perdoou ao Filho, nem o Filho perdoou a Si mesmo, mas satisfez com a sua morte à divina justiça, pelos pecados que nós tínhamos cometido.

Com efeito, Jesus Cristo não baixou à terra para condenar os pecadores, mas para livrá-los do inferno, sempre que queiram emendar-se. E quando os vê obstinados na sua perdição, compadecendo-se deles, diz-lhes pelo Profeta: Quare moriemini domus Israel? (5) — “Porque haveis de morrer, ó filhos de Israel?” Como se dissesse: Porque quereis morrer e ir para o inferno, se eu desci do céu para vos livrar da morte com o meu sangue? E depois acrescenta, pela boca do mesmo Profeta: Nolo mortem morientis:… revertimini et vivite (6) — “Não quero a morte do que morre; voltai e vivei”.

Quando os apóstolos São Tiago e São João, indignados pela afronta que os habitantes de Samaria fizeram a seu Mestre por não O quererem receber, disseram a Jesus: Senhor, quereis que mandemos que chova fogo do céu para punir a esses temerários? Jesus, que estava cheio de doçura para com aqueles que O desprezavam, respondeu-lhes: Não sabeis de que espírito deveis estar animados. O Filho do Homem não veio para perder os homens, mas para os salvar (6).

Meu doce Jesus, que reconhecimento Vos devo! Graças aos méritos do vosso sangue, nutro confiança de estar na vossa amizade. Se até hoje os perdi muitas vezes, não quero mais perder-Vos para o futuro. Vós mereceis todo o meu amor; não quero mais viver separado de Vós. Mas, meu Jesus, conheceis a minha fraqueza; dai-me a graça de Vos ser fiel até à morte e de recorrer a Vós na tentação. — Santíssima Virgem Maria, assisti-me, pois que sois a Mãe da santa perseverança; em vós ponho toda a minha esperança.

Referências:

(1) Lc 1, 78
(2) Jo 10, 10
(3) Rm 5, 20
(4) Jo 10, 11
(5) Ez 18, 31
(6) Ez 18, 32
(7) Lc 9, 56

(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I: Desde o Primeiro Domingo do Advento até a Semana Santa Inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 357-359)

Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I: Primeira Meditação para o 4º Domingo da Quaresma

 A multidão faminta e as almas do purgatório

Multiplicaçãoo dos Pães e Peixes


Unde ememus panes ut manducent hi? – “Onde compraremos pães para que estes comam?” (Jo 6, 5)

Sumário. A tenra compaixão que moveu o Senhor a multiplicar os pães para dar de comer à multidão que o seguia, deve mover-nos a socorrer as almas do purgatório, que são muito mais numerosas e muito mais famintas de seu alimento espiritual, que é Deus. O meio principal de que devemos usar para lhes levar socorro é a santíssima Eucaristia. Em sufrágio dessas almas, visitemos frequentemente a Jesus sacramentado; aproximemo-nos da mesa da comunhão, e, se não podemos mandar celebrar missas, ouçamos ao menos todas as que as nossas ocupações nos permitam ouvir.

I. Refere o Evangelho que, estando Jesus assentado sobre um monte, levantou os olhos, e viu ao redor de si uma multidão de quase cinco mil pessoas, que O seguiam, porque viam os milagres que fazia sobre os enfermos. Em seguida, sabendo que um moço tinha cinco pães de cevada e dois peixes, tomou-os em suas mãos, e, tendo dado graças, os mandou distribuir à multidão. Não somente houve o bastante para todos se fartarem, mas com os pedaços que sobejaram, os apóstolos encheram doze cestos. Eis aí o grande milagre que Jesus Cristo fez por compaixão de tantos pobres corporalmente.

Ora, é justo, ou para dizer melhor, é necessário que tenhamos compaixão das almas de outra multidão muito mais numerosa e incomparavelmente mais faminta do seu alimento espiritual: devemos compadecer-nos das almas benditas do purgatório. — Pobres almas! São muitas as penas que padecem naquele cárcere de tormentos; porém, acima de tudo aflige-as a privação da dulcíssima presença de Deus, cuja beleza infinita já conhecem. Não há na linguagem humana palavras apropriadas para exprimir qual seja esta pena; mas ainda que possuíssemos as palavras adequadas, faltar-nos-ia a capacidade de compreendê-las, preocupados como estamos com as coisas terrestres.

Mas a pena que a privação de Deus traz consigo é bem compreendida pelas pobres almas que a padecem. Por isso levantam a sua voz lamentosa e pedem-nos que lhes saciemos a fome inconcebível de contemplarem quanto antes o objeto de seu amor: Miseremini mei, saltem vos, amici mei, quia manus Domini tetigit me (1) — “Compadecei-vos de mim, ao menos vós, que sois meus amigos, porque a mão do Senhor me feriu”.

II. O milagre da multiplicação dos pães, assim como se conclui do Evangelho, foi feito para provar a presença verdadeira de Jesus na Eucaristia; e mesmo, segundo observavam os doutores, foi uma figura da Mesa eucarística. Eis, pois, o meio eficacíssimo de que, à imitação do Redentor, devemos lançar mão para saciarmos a fome das almas benditas do purgatório. — Visitemos muitas vezes o divino Sacramento, comunguemos com frequência; sobretudo mandemos celebrar em alívio das almas o sacrifício incruento da missa, ou ao menos ouçamos para sufragá-las todas as missas que pudermos. “Cada missa que se celebra”, diz São Jerônimo, “faz sair várias almas do purgatório”. E São Gregório acrescenta: “Quem assiste devotamente à missa, alivia as almas dos fiéis defuntos e contribui para lhes serem perdoados completamente os pecados”.

Pelo que uma pessoa muito devota às almas do purgatório, cada vez que ouvia tocar a entrada para uma missa, afigurava-se ver as almas no meio das chamas e ouvir os seus gritos lastimosos e angustiados. “Então”, assim dizia, “por urgentes que sejam as minhas ocupações, não posso deixar de assistir ao divino sacrifício, nem tenho coragem de lhes dizer: Esperai, porque hoje falta-me o tempo para vos ajudar”. — Façamos do mesmo modo, e fiquemos certos de que aquelas santas prisioneiras saberão mostrar-se agradecidas. Além disso, virá o tempo em que, estando nós também no purgatório, nos medirão a nós com a medida que nós tivermos medido aos outros (2).

Ó dulcíssimo Jesus, pela compaixão que mostrastes para com as multidões famintas que Vos acompanhavam, tende piedade das almas do purgatório. Volvei também para mim os vosso olhos piedosos, “e fazei, ó Deus todo-poderoso, que na aflição pelas minhas iniquidades, respire com a consolação de vossa graça”(3). † Doce Coração de Maria, sêde minha salvação.

Referências:

(1) Jó 19, 21
(2) Mt 7, 2
(3) Or. Dom. curr.

(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I: Desde o Primeiro Domingo do Advento até a Semana Santa Inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 355-357)

sexta-feira, 28 de março de 2025

Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I

Terceira dor de Maria Santíssima – Perda de Jesus no templo

Ecce pater tuus et ego dolentes quaerebamus te – “Eis que teu pai e eu Te andávamos buscando cheios de aflição” (Lc 2, 48)

Sumário. A dor de Maria pela perda de Jesus foi sem dúvida uma das mais acerbas; porque ela então sofria longe de Jesus, e a humildade fazia-lhe crer que o Filho se tinha apartado dela por causa de alguma negligência sua. Sirva-nos esta dor de conforto nas desolações espirituais; e ensine-nos o modo de buscarmos a Deus, se jamais para nossa desgraça viermos a perdê-Lo por nossa culpa. Lembremo-nos, porém, de que quem quiser achar a Jesus, não O deve buscar entre os prazeres e delícias, mas no pranto, entre as cruzes e mortificações, assim como Maria o procurou.

I. Quem nascer cego, pouco sente a pena de ser privado de ver a luz do dia; mas quem noutro tempo teve a vista e gozou a luz, muita pena sente em se ver dela privado. E assim igualmente as almas infelizes que, cegas pelo lodo desta terra, pouco têm conhecido a Deus, pouco sentem a pena de O não acharem. Ao contrário, quem, iluminado pela luz celeste, foi feito digno de achar no amor a doce presença do supremo Bem, ó Deus! Que tristeza sente em ver-se dela privado.

Vejamos portanto o muito que a Maria, acostumada a gozar continuamente a dulcíssima presença de seu Jesus, devia ser dolorosa a terceira espada que a feriu, quando, havendo-O perdido em Jerusalém, por três dias se viu dele separado. ― Alguns escritores opinam que esta dor não foi somente uma das maiores que teve Maria na sua vida, mas que foi em verdade a maior e mais acerba. E com razão, porque então ela não sofria em companhia de Jesus, como nas outras dores; e porque a sua humildade lhe fazia crer que Jesus se tinha afastado dela por alguma negligência no seu serviço. Por esta razão aqueles três dias lhe foram excessivamente longos e se lhe afiguraram séculos, cheios de amargura e de lágrimas.

Num quem diligit anima mea vidistis? (1) ― “Vistes porventura àquele a quem ama a minha alma?” É assim que a divina Mãe, como a Esposa dos Cantares, andava perguntando por toda a parte. E depois, cansada pela fadiga, mas sem O ter achado, oh, com quanto maior ternura não terá dito o que disse Ruben de seu irmão: Puer non comparet, et ego quo ibo? (2) ― “O menino não aparece, e eu para onde irei?” O meu Jesus não aparece, e eu não sei que mais possa fazer para O achar; mas aonde irei sem o meu tesouro? Ah, meu filho dileto! Cara luz de meus olhos: faze-me saber onde estás, a fim de que eu não ande mais errando e buscando-Te em vão. Numa palavra, afirma Orígenes que pelo amor que esta santa Mãe tinha a seu Filho, padeceu mais nesta perda de Jesus que qualquer outro mártir no tormento que o privou da vida.

II. Esta dor de Maria, em primeiro lugar, deve servir de conforto àquelas almas que estão desoladas e não gozam a doce presença de seu Senhor, gozada em outros tempos. Chorem, sim, mas chorem com paz, como chorou Maria a ausência de seu Filho. Não temam por isso de terem perdido a divina graça, animando-se com o que disse Deus mesmo a Santa Teresa: “Ninguém se perde sem o conhecer; e ninguém fica enganado sem querer ser enganado”. ― Se o Senhor se ausenta dos olhos da alma que o ama, nem por isso se ausenta do coração. Esconde-se muitas vezes para ser por ela buscado com mais desejo e amor. Mas quem quer achar a Jesus, é preciso que o busque, não entre as delícias e os prazeres do mundo, mas entre as cruzes e mortificações, como o buscou Maria: Dolentes quaerebamus te ― “Nós Te andávamos buscando cheios de aflição”.

Além disso, neste mundo não devemos buscar outro bem senão Jesus. Jó não foi, por certo, infeliz quando perdeu tudo o que possuía neste mundo, até descer a um monturo. Porque tinha consigo Deus, também então era feliz. Verdadeiramente infelizes e miseráveis são aquelas almas que perderam a Deus. Se, pois, Maria chorou a ausência do Filho, quanto mais deveriam chorar os pecadores que perderam a divina graça, e aos quais Deus diz: Vos non populus meus, et ego non ero vester (3) ― “Vós não sois meu povo, e eu não serei mais vosso”.

Mas a maior desgraça para aquelas pobres almas, diz Santo Agostinho, é que, se perdem um boi, não deixam de procurá-lo; se perdem uma ovelha, não poupam diligência para achá-la; se perdem um jumento, não têm mais repouso; mas se perdem o sumo Bem, que é Deus, comem, bebem e ficam quietos. ― Ah, Maria, minha Mãe amabilíssima, se por minha desgraça eu também perdi a Jesus pelos meus pecados, rogo-vos, pelos méritos das vossas dores, fazei que eu depressa O vá buscar e O ache, para nunca mais tornar a perdê-Lo em toda a eternidade.

Referências:

(1) Ct 3, 3
(2) Gn 37, 30
(3) Os 1, 9

(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I: Desde o Primeiro Domingo do Advento até a Semana Santa Inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 352-355)

Santo do dia

 

Aqueles que semeiam em lágrimas, disse o Espírito Santo, colherão em alegria. O lavrador rasga o seio da terra para ali lançar a semente: do mesmo modo o cristão confia o germe da sua felicidade eterna à angústia da dor e da provação da vida presente; mas ele sabe que o tempo da colheita chegará em breve, e que no céu a colheita será alegre e abundante.



29 de março: São Jonas e São Baraquisio, mártires (327)


No ano 327 da era cristã, viviam em uma pequena aldeia na Pérsia dois irmãos cristãos chamados Jonas e Baraquísio; Eles temiam a Deus e observavam fielmente Sua lei.


Ao saberem que o rei Sapor havia emitido um decreto contra a religião de Cristo e que um grande número de cristãos já estava na prisão, eles resolveram enfrentar a perseguição e ir encorajar os mártires. À vista de vários cristãos em tormento:


“Não tenham medo”, disseram-lhes, “combatamos, meus irmãos, pelo nome de Jesus crucificado, e obteremos, como nossos predecessores, a gloriosa coroa prometida aos valentes soldados da fé”.


Apoiadas por essas palavras, as vítimas consumiram seu sacrifício sem fraqueza. Mas isso foi o suficiente para despertar a ira dos ministros do rei. Jonas e Baraquísio são presos e ameaçados de morte se não adorarem os deuses da Pérsia, o sol, o fogo e a água. Sua recusa é seguida de tortura cruel.


Jonas, amarrado a uma estaca, é espancado com varas cobertas de espinhos até que suas costelas fiquem expostas; mas ele abençoa e glorifica o Senhor. Ele foi então arrastado, com uma corrente nos pés, para um lago congelado para passar a noite lá.


Enquanto isso, Barachisius, por sua vez, confunde a loucura dos adoradores de ídolos e afirma que nunca adorará ninguém além daquele que é o Criador todo-poderoso do sol, do fogo e da água. Chumbo derretido é derramado sobre seus olhos, boca, nariz e ouvidos, e então ele é suspenso por um pé em sua prisão.


No dia seguinte, a luta começa novamente para os dois irmãos. Às perguntas zombeteiras de seus algozes, Jonas responde:


"Deus nunca me deu uma noite mais feliz e mais tranquila", e então ele fala com eles com uma eloquência e sabedoria que os enche de espanto e admiração, apesar de si mesmos, sem, contudo, diminuir sua barbárie. Cortaram os dedos das mãos e dos pés do santo mártir e depois o jogaram em um caldeirão de piche fervente, depois de terem removido a pele de sua cabeça. Tendo-o poupado do piche fervente, eles o colocam sob uma prensa de parafuso e o moem girando este instrumento horrível sobre ele; e foi nessa tortura que Jonas terminou sua luta vitoriosa.


Quanto ao seu irmão Baraquísio, ele não era menos admirável. Jogado em um arbusto cheio de espinhos afiados, ele só foi arrancado para ter pontas de junco cravadas em sua carne e violentamente arrancadas. Em vez de reclamar, a gentil vítima, seguindo o exemplo do Mestre, orou por seus inimigos. Seu corpo foi então esmagado sob a mesma prensa onde seu irmão havia morrido.

quinta-feira, 27 de março de 2025

Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I

 Comemoração das cinco Chagas de Nosso Senhor Jesus Cristo

Haurietis aquas in gaudio de fontibus Salvatoris “Tirareis com alegria águas das fontes do Salvador” (Is 12, 3)

Sumário. As Chagas de Jesus são aquelas benditas fontes preditas por Isaías, das quais podemos tirar todas as graças, se as pedimos com fé. São fontes de misericórdia, fontes de esperança, e sobretudo fontes de amor; porquanto as suas águas, ao passo que purificam a alma das manchas da culpa, abrasam-na no santo amor. Avizinhemo-nos muitas vezes daquelas fontes do Salvador, para apagar a nossa sede das graças.


I. As Chagas de Jesus Cristo são aquelas benditas fontes preditas por Isaías, das quais podemos tirar todas as graças, se as pedimos com fé: Haurietis aquas in gaudio de fontibus Salvatoris — “Tirareis com alegria água das fontes do Salvador”.

São em primeiro lugar fontes de misericórdia. Jesus Cristo quis que lhe fossem traspassados as mãos, os pés e o lado sacrossanto, a fim de aplacar por nós a divina justiça e ao mesmo tempo abrir-nos um asilo seguro, no qual nos pudéssemos subtrair às setas da ira de Deus.

Por isso, o Senhor mesmo nos anima, dizendo no Cântico dos cânticos: Vem, pomba minha, nas aberturas da pedra (1); isto é, na interpretação de São Pedro Damião: vem dentro destas minhas chagas, onde acharás todo o bem para tua alma. — Mais expressivas ainda são as palavras de que se serve na profecia de Isaías: Ecce in manibus meis descripsi te (2) — “Eis aí que te gravei em minhas mãos”. Como se dissesse: Minha pobre ovelha, tem ânimo; não vês quanto me custaste? Eu te gravei em minhas mãos, nestas chagas que recebi por teu amor. Elas me solicitam sempre a ajudar-te e defender-te de teus inimigos; tem, pois, amor e confiança em mim.

As Chagas de Jesus são também fontes de esperança; porquanto, como escreve São Paulo, o Senhor quis morrer consumido pelas dores, a fim de merecer o paraíso para todos os pecadores arrependidos e resolvidos a emendar-se: Et consummatus, factus est omnibus obtemperantibus causa salutis (3) — “E pela sua consumação foi feito autor da salvação para todos os que Lhe obedecem”. — Durante uma enfermidade, São Bernardo se viu certa vez transportado perante o tribunal de Deus, onde o demônio o acusava de seus pecados e lhe dizia que não merecia o céu. Respondeu-lhe então o Santo: “É verdade que eu não mereço o paraíso; mas Jesus tem dois direitos para este reino: um por ser Filho verdadeiro de Deus, outro por tê-lo merecido com a sua morte. Contentando-se com o primeiro, cedeu-me o segundo, em virtude do qual peço e espero a glória celeste”. É isto, meu irmão, o que nós também podemos dizer: As Chagas de Jesus Cristo são os nossos merecimentos, a nossa esperança: Vulnera tua merita mea.

II. As Chagas de Jesus Cristo são, em terceiro lugar, fontes de amor; porque as águas que ali brotam, purificam as almas e ao mesmo tempo abrasam-nas daquele santo fogo que o Senhor veio acender sobre a terra nos corações dos homens. Pelo que São Boaventura exclama:

“Ó Chagas que feris os corações mais duros e abrasais as almas mais frias de amor divino.”

São Paulo protestou solenemente de si: Non enim indicavi scire me aliquid inter vos, nisi Iesum Chistum, et hunc crucifixum (4) — “Não entendi saber entre vós coisa alguma senão a Jesus Cristo, e este crucificado”. Não ignorava, de certo, o apóstolo, que Jesus Cristo nascera numa gruta, que passara trinta anos de sua vida numa oficina, que ressuscitara e subira ao céu. Não obstante isso diz que não queria saber senão de Jesus crucificado, porque este mistério o excitava mais a amá-Lo, visto que as sagradas Chagas lhe diziam o amor imenso que Jesus nos teve. — Recorramos, pois, frequentes vezes por meio de uma meditação atenta a estas fontes divinas do Salvador: Omnes sitientes venite ad aquas (5) — “Todos vós os que tendes sede, vinde às águas”.

Eterno Pai, lançai vossos olhos sobre as Chagas de vosso divino Filho: estas Chagas Vos pedem todas as misericórdias para mim; perdoai-me, pois, as ofensas que Vos fiz; apoderai-Vos de meu coração todo, para que não ame, busque, nem deseje coisa alguma fora de Vós. Ó Chagas de meu Redentor, formosas fornalhas de amor, recebei-me e inflamai-me, não com o fogo do inferno que mereço, mas com a santa chama de amor a este Deus que quis morrer por mim, à força de tormentos. — “E Vós, Eterno Pai, que pela paixão de vosso Filho unigênito e pelo sangue que Ele derramou por suas cinco chagas, renovastes a natureza humana, perdida pelo pecado: concedei-me propício que, venerando na terra estas chagas divinas, eu mereça conseguir no céu o fruto do sangue preciosíssimo de Jesus.” (6) — Fazei-o pelo amor do próprio Jesus Cristo e de Maria Santíssima.

Referências:

(1) Ct 2, 14
(2) Is 49, 16
(3) 1Cor 2, 2
(4) Is 55, 1
(5) Or. fest. curr.

(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I: Desde o Primeiro Domingo do Advento até a Semana Santa Inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 349-352)

Santo do dia



SÃO JOÃO DE CAPISTRANO - CONFESSOR


SÃO JOÃO DE CAPISTRANO é um dos luminosos astros do céu cristão do século XV. Natural de Capistrano, do reino de Nápoles, recebeu o nome dessa cidade. Privilegiado de belos talentos, fez em Perugia o curso de ambos os direitos, doutorou- se e desempenhou o cargo de juiz de direito a contento de todos. Um dos cidadãos mais importantes da cidade deu-lhe a filha em matrimônio. Nada parecia faltar-lhe à felicidade. Faltou, porém, a constância da mesma.

A cidade de Perugia recusou a reconhecer a soberania do rei Ladisláu, de Nápoles e declarou-lhe guerra. João de Capistrano recebeu a incumbência de conferenciar com o Rei sobre as condições da paz, e tudo parecia prometer bom êxito. Essas esperanças se desvaneceram, e os concidadãos começaram a duvidar da sua boa fé. Tão bem fundadas pareciam-lhes essas suspeitas, que o prenderam e o recolheram à fortaleza de Brussa. De nada lhe valeu apelar para o espírito de lealdade do rei de Nápoles.

Tudo isso foi necessário, para que se convencesse da falsidade do mundo, da inconstância da amizade dos homens e da futilidade do que se chama felicidade. Recebendo ainda a notícia da morte da sua esposa, na idade de 39 anos, tomou a resolução de abandonar o século e entrar numa ordem religiosa.

Para este fim vendeu todos os bens, pagou o resgate, e pediu o hábito de São Francisco. O Superior da Ordem, conhecendo os antecedentes, suspeitava João ter agido um tanto precipitadamente, e talvez lhe faltasse a perseverança e verdadeiro espírito religioso. Sujeitou por isto o noviço a uma prova duríssima, capaz de pôr em relevo a humildade e firmeza do candidato.

Obrigou-o a envergar traje de arlequim, pôs-lhe nas costas uma taboleta na qual se vai registrada uma série de crimes e neste estado lhe fez montar uma mula e passar pelas principais ruas de Perugia. João obedeceu, e com a maior prontidão cumpriu não só esta, como ainda outras ordens bem humilhantes.

Decorrido um ano, foi admitido à emissão dos votos. Desde aquele tempo a vida de João de Capistrano era um jejum perpétuo. Durante trinta anos se absteve completamente do uso da carne.

Tinha por leito o soalho, e ainda assim dava poucas horas ao descanso. Quotidianamente sujeitava o corpo às mais ásperas mortificações.

Uma vez separado do mundo, o coração do Santo pertenceu a Deus, e só a ele procurou servir. Achava suas delícias na oração, na meditação e na leitura espiritual. Ligeiras passavam-lhe as horas que permanecia na presença do Santíssimo Sacramento.

Orador de grande recurso, com facilidade comunicava aos ouvintes o amor de Deus, que lhe ardia no coração. O efeito dessas prédicas foi muitas vezes imediato. Aconteceu assim que em Aquiléia, Nüremberg e Leipzig, que, tendo pregado sobre a vaidade do mundo, logo após a prática vieram muitas senhoras entregar ao Santo as jóias, bem como outros objetos, que lhes pareciam inúteis e embaraçosos à santificação…

Na Boêmia mais de cem moços pediram para ser admitidos na Ordem Franciscana, depois da audição de um sermão que João de Capistrano fizera, sobre o juízo universal.

Na qualidade de inquisidor pontifício abriu forte campanha contra os "Fraticelli" e os judeus. Com afinco trabalhou na reforma da sua Ordem, que teve sua aprovação pelo Papa Martinho V, mas foi rejeitada pelos "conventuais". Colocado à frente dos "Observantes", em 1437, foi nomeado comissário apostólico e Visitador Geral. Como tal visitou as cidades de Milão, Veneza, a Terra Santa, a França e a Sicília. A pedido do imperador Frederico III percorreu a Áustria, a Turíngia e a Polônia.

Grande perigo surgiu para a cristandade, com o rápido avanço turco de Mahomed II. O Império grego não resistiu aos ataques: Constantinopla caíra-lhes nas mãos e com a capital, mais de duzentas cidades capitularam. Em 1456 apareceu o Califa com um grande exército às portas de Belgrado, ameaçando avassalar a Europa inteira. O Papa confiou a João de Capistrano a pregação duma cruzada contra o inimigo comum. Encarniçadíssimo foi o combate pela posse de Belgrado.

Os cristãos, sob o comando de João Hunyady defenderam-se contra um inimigo dez vezes mais forte, e mais de uma vez parecia a vitória pertencer aos turcos. Embora repelidos por diversas vezes, estes sempre com nova fúria e ímpeto, quase irresistível repetiram os ataques. O número reduzido dos combatentes cristãos estava ao ponto de desfalecer, quando João de Capistrano apareceu nas fileiras, e seu grito: "Vitória, Jesus, vitória!" – animou os guerreiros a redobrar os esforços.


Dos turcos apoderou-se grande pavor, e, desorganizados, desistiram do combate. Mahomed caiu gravemente ferido, e milhares de cadáveres de soldados turcos juncaram o campo de batalha. A vitória dos cristãos foi completa, e não faltou quem a atribuísse à santidade de João de Capistrano. Este, porém, rendeu graças a Deus e retirou-se para o convento de Villach, na Hungria, onde três meses depois morreu. O túmulo do Santo foi mais tarde profanado pelos Luteranos, que o arrombaram e atiraram com o corpo ao Danúbio.


João de Capistrano morreu em 23 de outubro de 1456, com 71 anos de idade. Alexandre III, em 1690 pôs-lhe o nome no catálogo dos Santos da Igreja. Leão XIII estendeu à toda a Igreja a sua festa, que é celebrada em 28 de março.


— Retirado e adaptado do livro: Lehmann, Pe. João Batista , S.V.D., Na Luz Perpétua, Lar Católico, Juiz de Fora, 1956.


Misson Basilica Saint John of Capistrano - San Juan Capistrano, CA.




    Ele nasceu em Capistrano, Itália em 1386, estudou leis e tornou-se governador de Peruvia, Itália em 1412.Sua vida foi somente dedicada ao espírito. Durante trinta anos fez rigoroso jejum, duras penitências e se dedicou às orações. Trabalhou com energia, evangelizando na Itália, França, Alemanha, Áustria, Hungria, Polônia e Rússia. Tornou-se grande pregador e os registros mostram, que, após sua pregação, muitos jovens decidiam entrar na Ordem de São Francisco de Assis. em 1416 amigo e aluno de São Bernardino de Siena. Ele foi ordenado em 1420. Após uma carreira notável como franciscano João foi convidado a ser o legado papal na Palestina, Milão, Sicília, Áustria, Bavária, Polônia, Bohemia e Silésia para combater os "hussites" (seguidores de Jan Hus).
  Foi conselheiro de quatro papas. Com 70 anos, defendeu a Itália numa guerra que ajudou a vencer. A famosa batalha de Belgrado, contra os invasores turcos muçulmanos. . .
  João de Capistrano com seus setenta anos de idade foi a luta, quando um enorme exército ameaçava tomar toda a Europa, pois já dominava mais de duzentas cidades. O papa Calisto III o designou como pregador de uma cruzada, que defenderia o continente. Com ele à frente, os cristãos tiveram de combater um exército dez vezes maior. A guerra já estava quase perdida e os soldados estavam a ponto de desfalecer, quando surgiu João animando a todos, percorrendo as fileiras e mantendo-os estimulados na fé em Cristo. Agiu assim durante onze dias e onze noites sem cessar. Espantados com a atitude de João, os guerreiros muçulmanos apavoraram-se, o exército se desorganizou e os soldados cristãos dominaram o campo de batalha até a vitória final.
  Vitória que, embora preferisse manter o anonimato, foi atribuída a João de Capistrano. Depois disso, retirou-se para o Convento de Villach, na Áustria, onde morreu três meses depois, no dia 23 de outubro de 1456. João encarava esses homens e mulheres como hereges e com implacável hostilidade, e seus métodos eram tão obstinados que ele às vezes foi reprovado. Quando os turcos capturaram Constantinopla, (hoje Istambul), a capital do Império Bizantino em 1453, João se devotou a uma incansável cruzada contra os Otomanos que estavam avançando sobre os Balcãs.
  João conseguiu uma audiência com o General Janos Hunyadi. Hunyadi inspirado pelo santo reuniu os húngaros que resistiram aos turcos e ele pessoalmente comandou uma ala do exercito cristão na batalha de Belgrado em 1456. A vitória de Belgrado salvou a Europa de ser conquistada pelos turcos.
 Na arte Litúrgica da Igreja ele é representado como um franciscano apontando um crucifixo que ele segura; ou 2) com um crucifixo e uma lança; ou 3) pisando em um turbante; ou 4) pregando com anjos e um rosário e o emblema IHS acima dele; ou 5) com a bandeira com a cruz em seu peito.
 Ele morreu em 23 de outubro de 1456 em Vilach, Áustria de uma praga que varreu a região. O seu culto se mantém vivo até os nossos dias, sendo celebrado no dia de sua morte tanto no Oriente e como no Ocidente. 
  São João Capistrano foi canonizado em 1724 papa Bento XIII.São João de Capistrano é o padroeiro dos juízes.
(Contam que foi tão grande era a revolta dos protestantes a veemência de João, que mais tarde, em 1526, os Calvinistas jogaram suas relíquias em um poço).

Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo II

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