terça-feira, 31 de dezembro de 2024

Santo do dia

 Trabalhar para circuncidar, isto é, cortar toda ação, toda palavra, todo desejo que não esteja de acordo com a regra do Evangelho.


 1º de janeiro: A Circuncisão do Salvador


É neste dia abençoado que a terra vê fluir as primícias do Sangue divino que deve purificar e salvar a humanidade caída; Jesus, no oitavo dia após o Seu nascimento, submeteu-se à Circuncisão, e começou a sofrer por nós.

A circuncisão foi o sinal da aliança anteriormente feita pelo Senhor com Abraão; e o povo judeu, descendente deste grande patriarca, sempre foi fiel a esta prática sagrada, considerada como iniciação ao serviço do verdadeiro Deus. O filho, na lei antiga, tornou-se filho de Deus através da Circuncisão, assim como se torna, de forma mais perfeita, filho de Deus na nova lei através do Batismo. Jesus, Filho de Deus e próprio Santidade, não teve necessidade de se submeter a uma lei dura e humilhante, feita para homens pecadores. Mas o duplo propósito da Sua vinda à terra faz com que Ele aceite este primeiro sacrifício de todo o coração; Ele se mostra, neste dia, nosso Salvador e nosso Modelo: Salvador, Ele inaugura a obra da nossa redenção; Como modelo, Ele nos ensina a amar a lei de Deus, a guardá-la fielmente, a não procurar pretextos vãos para desculpar a nossa covardia e a nossa desobediência, e a curar o nosso orgulho através da prática da humildade.


A Circuncisão Corporal esconde, aliás, para o cristão, um belo e grande mistério, porque é a imagem da Circuncisão espiritual que consiste em circuncidar o nosso coração de todos os seus afetos culpados, em destruir em nós o pecado e as más paixões e viver um sobrenatural. vida.


O Apóstolo São Paulo mergulhou profundamente no significado espiritual da circuncisão carnal; os Padres e os autores espirituais só tiveram que comentar os textos muito sugestivos das suas Epístolas: “A verdadeira circuncisão”, diz ele (Rom. II, 28), “não é aquela que aparece na carne, é a do coração; , no espírito, e não na letra."


“Em Cristo Jesus, nem a circuncisão nem a incircuncisão têm valor, mas a fé, que opera pela caridade. O que é tudo é ser nova criatura (Gál. V, 6; VI, 15).”

“Em Cristo Jesus vocês foram circuncidados com uma circuncisão não feita por mãos, a circuncisão de Cristo, despojando-se deste corpo de carne (Col. II, 11).” Toda a doutrina do grande Apóstolo resume-se a mostrar que a Lei Antiga era apenas uma figura e uma preparação da Lei de Cristo, que toda a vida cristã consiste em renunciar à carne com as suas concupiscências para viver interiormente a partir da vida de o espírito, e que só são verdadeiramente de Cristo aqueles que o seguem no caminho do sacrifício. É todo o Evangelho em si.

Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I

A Circuncisão de Jesus e o Sacramento do Batismo

circuncisao jesus

Consummati sunt dies octo, ut circuncideretur Puer – “Foram cumpridos os oito dias para ser circuncidado o Menino” (Lc 2, 21)

Sumário. A cerimônia da circuncisão era figura do sacramento do batismo. Podemos, por tanto, imaginar que Jesus Cristo, quando foi circuncidado, pensou em cada um de nós, e que oferecendo a seu divino Pai as primícias do seu sangue, desde então nos mereceu a graça de sermos regenerados pelo batismo. Oh, que dom inestimável é o do santo batismo! Como, porém, temos respondido a tamanho favor? Temos, por ventura, manchado a vestimenta branca da inocência?

I. Considera o Pai Eterno, que, tendo enviado seu Filho a fim de padecer e de morrer por nós, quer que no dia de hoje seja circuncidado e comece a derramar o seu sangue divino, para depois acabar de derramá-lo no dia da sua morte na cruz num, oceano de dores e desprezos. E porque? A fim de que esse Filho inocente pague assim as penas por nós merecidas. É, pois, com razão que a Igreja canta: Ó bondade admirável da misericórdia divina para conosco! Ó inestimável amor de compaixão! A fim de remires o homem entregaste teu Filho à morte! — Ó Deus eterno, quem seria capaz de fazer-nos esse dom infinito, senão Vós que sois a bondade infinita? E se, com o dom do vosso Filho, me destes o que mais caro possuíeis, justo é que eu miserável me dê todo a Vós.

Considera por outro lado o divino Filho, que, todo humilde e cheio de amor para conosco, abraça a morte amargosa, que lhe está destinada, para nos salvar, a nós pecadores, da morte eterna. De boa vontade começa hoje a satisfazer por nós à divina justiça, com o preço do seu sangue. — Nosso Senhor disse:

“Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a própria vida por seus amigos.” (1)

O amor, porém, de Jesus Menino foi muito além, porquanto, assim como diz São Paulo, Ele chegou a sacrificar a vida por nós, seus inimigos:

Cum inimici essemus, reconciliati sumus Deo per mortem Filii eius (2) — “Sendo inimigos de Deus, fomos com Ele reconciliados pela morte de seu Filho”

Portanto, ó meu Jesus, é por meu amor que aceitastes a morte; e que farei eu? Continuarei porventura a ofender-Vos com os meus pecados? Não, Redentor meu, não mais quero ser-Vos ingrato; hoje quero com todas as verás começar a amar-Vos de todo o meu coração. Vós, porém, ó Deus todo-poderoso, concedei-me a graça para Vos ser fiel.

“E já que me fizestes chegar ao começo deste ano, salvai-me pelo vosso poder, a fim de que no correr do mesmo não caia eu em nenhuma falta, e os meus pensamentos, palavras e obras tenham por único escopo fazer aquilo que com toda a justiça exigirdes de mim.” (3)

II. A cerimônia da circuncisão, no dizer dos Santos Padres, prefigurava o sacramento do batismo. É portanto bem a propósito considerarmos que Jesus Menino, quando se sujeitou à circuncisão, pensava em cada um de nós. Oferecendo então a Deus Pai as primícias do seu sangue, começou a merecer-nos a graça de sermos regenerados na fonte batismal. Oh, que dom inapreciável é o do santo batismo! Por meio d’Ele as nossas almas deixaram de ser escravas do demônio, condenadas ao inferno, e se tornaram filhas escolhidas de Deus e herdeiras ditosas do reino dos céus. — Mas, como é que nós temos respondido a tão grande favor?… Lancemos a vista sobre a nossa consciência e vejamos se jamais temos manchado a vestimenta branca da inocência, e prostrando-nos aos pés de Jesus Cristo renovemos os nossos votos do batismo. Para que depois os guardemos fielmente, consideremos cada dia que desponta, como se fosse o último da nossa vida. E, com efeito, meu irmão, quem sabe se ainda vereis o fim do ano que hoje começa?

Senhor meu amabilíssimo, prostrado na presença de vossa divina Majestade, agradeço-Vos o me haverdes adotado por filho no santo batismo. Quero hoje renovar (as promessas que Vos fiz naquele dia, e Vô-las ofereço tintas no sangue que Jesus por meu amor derramou na sua dolorosa circuncisão. Em nome da Santíssima Trindade, Padre, Filho e Espirito Santo, protesto que de todo o coração renuncio a Satanás, às suas pompas e às suas obras. Pesa-me de haver tantas vezes profanado pelos meus pecados o caracter de cristão, e juro que para o futuro Vos quero permanecer fiel. Ó anjos do paraíso, e em particular vós, ó meu anjo da guarda, que um dia anotastes as minhas promessas, sêde hoje novamente testemunhas desta minha resolução. Antes quero morrer do que faltar à promessa do meu batismo, e viver um instante na inimizade de Deus. Vós, ó meu Jesus, dai-me a santa perseverança; fazei-o pela intercessão do Santo cujo nome tomei na pia batismal; fazei-o pelo amor de São José e de Maria Santíssima, que no dia da vossa circuncisão ficaram tão aflitos vendo-Vos derramar pela primeira vez o vosso preciosíssimo sangue.

Referências:

(1) Jo 15, 13
(2) Rm 5, 10
(3) Or. Eccl.

(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I: Desde o Primeiro Domingo do Advento até a Semana Santa inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 105-108)

segunda-feira, 30 de dezembro de 2024

Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I: Meditação para a Tarde do último dia do ano

Jesus Cristo tem feito e padecido tudo por nosso amor

Cristo padeceu na Cruz por amor a nós!
Cristo padeceu na Cruz por amor a nós!

Dilexit me, et tradidit semetipsum pro me – “Ele me amou, e se entregou a si mesmo por mim” (Gl 2, 20)

I. Se é verdade, ó meu Jesus, que por meu amor abraçastes uma vida penosa e uma morte amargosa, posso dizer com razão, que a vossa morte é minha, que são minhas as vossas dores, meus os vossos merecimentos, que, em suma,Vós mesmo sois meu, já que por meu amor Vos entregastes a tão grandes padecimentos. Ah, meu Jesus! Nada me aflige tanto como o pensar que houve um tempo em que Vós éreis meu, e eu voluntariamente Vos tenho perdido repetidas vezes. Perdoai-me e estreitai-me ao vosso peito, nem permitais que eu ainda torne a ofender-Vos. Amo-Vos de toda a minha alma. Vós quereis ser todo meu, eu quero ser todo vosso.

O Filho de Deus, por ser Deus verdadeiro, é infinitamente feliz. Contudo, observa Santo Tomás, Ele tem feito e padecido tanto por amor do homem, como se sem este não pudesse ser feliz: quasi sine ipso beatus esse non posset. Se Jesus Cristo, durante a sua vida terrestre, tivera de merecer a eterna bem-aventurança para si mesmo, que é que mais pudera fazer do que carregar-se de todas as nossas fraquezas, tomar sobre si todas as nossas misérias, para depois terminar a vida com uma morte tão dura e ignominiosa? Mas Jesus era inocente, santo e bem-aventurado em si mesmo; tudo quanto tem feito e padecido, tem-no feito a fim de merecer para nós a graça divina e o paraíso perdido. — Desgraçado de quem não Vos ama, ó Jesus meu, e não vive abrasado no amor de tão grande bondade!

II. Se Jesus Cristo nos houvera permitido, que lhe pedíssemos as provas mais manifestas do seu amor, quem jamais se teria animado a pedir-lhe, se fizesse criança semelhante às outras crianças, abraçasse todas as nossas misérias, se fizesse entre os homens, o mais pobre, o mais desprezado, o mais mal tratado, até morrer à força de tormentos sobre um lenho infame, amaldiçoado e abandonado de todos, mesmo do seu próprio Pai? Mas o que não nos animaríamos nem sequer a imaginar, Jesus o excogitou e fez.

Ó meu amado Redentor, peço-Vos que me concedais a graça, que para mim merecestes com a vossa morte. Amo-Vos e pesa-me de Vos ter ofendido. Tomai posse da minha alma; não quero que ela continue em poder do demônio. Quero que ela seja toda vossa, já que Vós a comprastes com o vosso sangue. Vós me amais a mim e eu quero só amar a Vós. Preservai-me do castigo de viver sem o vosso amor, e pelo mais castigai-me como quiserdes. Maria, meu refúgio, a morte de Jesus e a vossa intercessão são a minha esperança.


(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I: Desde o Primeiro Domingo do Advento até a Semana Santa Inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 104-105)

Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I

Devemos aproveitar o Tempo

Aproveitemos o tempo que temos com Sabedoria!
Aproveitemos o tempo que temos com Sabedoria!


Ecce breves anni transeunt, et semitam per qyuam non revertar ambulo
 – “Ve que passam os breves anos, e eu caminho por uma vereda pela qual não voltarei” (Jó 16, 23)

I. O tempo, sobre ser a coisa mais preciosa, porque é um tesouro que só neste mundo se acha, é ainda de mui curta duração. Ecce breves anni transeunt. Lembra-te de como se passaram depressa os doze meses do ano que hoje finda! – É, portanto, com razão que o Espírito Santo nos exorta a conservarmos o tempo, e não deixarmos perder-se um só momento sem o aproveitarmos bem. Mas, ai de nós! Quão diversamente vão as coisas! Ó tempo desprezado! Tu serás a coisa que os mundanos desejarão mais na hora da morte, quando ouvirem dizer que para eles não haverá mais tempo: Tempus non erit amplius.

E tu, irmão meu, em que empregas o teu tempo? Deus te concedeu a graça de teres chegado até ao dia de hoje, com preferência a tantos milhares e milhões de pessoas, talvez da tua idade, ou mesmo mais novas, talvez fortes como tu ou ainda mais robustos, com a mesma compleição que tu, ou talvez mais sadia. Elas morreram e tu estás vivo! Elas estão reduzidas à podridão e cinzas no túmulo e tu estás aqui meditando! Elas na eternidade, e muitas infelizmente no inferno, e tu ainda no tempo! Mas como é que passas o tempo? Em que coisas o empregaste até hoje?

Fase aqui aos pés de Jesus Cristo um exame geral da tua vida. Pondera por um lado as inúmeras graças com que Deus te tem cumulado especialmente no correr deste ano; por outro recorda as faltas, as imperfeições, quiçá os pecados, com que continuamente, desde o primeiro dia do ano até este último, tens ofendido o Senhor, retribuindo-lhe a liberdade infinita com ingratidão. – Ah! se não resgatares desde já o tempo inutilmente perdido, ou quiçá mal empregado, ele te causará remorsos amargosos, quando, no leito da morte, te achares próximo àquele grande momento do qual depende a eternidade!

II. Meu irmão, se, por desgraça, tiveres de reconhecer que passaste na tibieza o tempo do ano que se passou, procura passar no fervor ao menos este último dia. Agradece muitas vezes a Deus o ter-te conservado em vida até ao dia de hoje e pede-lhe perdão das negligências passadas no seu serviço. Visto que não sabes se viverás até ao dia de amanhã e se entrarás ainda no ano novo, põe hoje mesmo em ordem as coisas de tua consciência e purifica a tua alma por meio de uma confissão anual. Afinal, fase um propósito firme e eficaz de servires a Deus para o futuro com mais zelo, e de empregares melhor o ano vindouro. É assim que, no dizer do Apóstolo, andarás no caminho da salvação com circunspecção, e recobrarás o tempo: Videte quomodo caute ambuletis… redimentes tempus (1) – “Vede como andais prudentemente… remindo o tempo”.

“Ó Senhor, cuja misericórdia não tem limites, cuja bondade é um tesouro inesgotável, dou graças à vossa Majestade piedosíssima, por todos os benefícios que me tendes feito, e em particular, pelo tempo que me concedeis para chorar as minhas culpas, e reparar as minhas desordens. Quem sabe se o ano que hoje finda, não será talvez o último inteiro da minha vida? Não, não quero mais resistir aos vossos convites tão amorosos. Pesa-me, ó meu Bem supremo, de Vos ter ofendido e proponho fazer de hoje em diante contínuos atos de amor, afim de compensar o tempo perdido.

Como, porém, os mistérios da vida não me permitem dirigir os meus pensamentos sem interrupção para Vós, faço hoje o seguinte ajuste, que será válido durante todo o ano vindouro e todo o tempo da minha vida. Cada vez que levantar os olhos para contemplar o céu, tenho intenção de glorificar as vossas perfeições infinitas. Quantas vezes respirar, quero oferecer-Vos a paixão e o sangue de meu divino redentor, bem como os merecimentos de todos os Santos, para a salvação do mundo inteiro e em satisfação dos pecados que se cometerem.

Toda vez que bater no peito, quero amaldiçoar e detestar cada um dos pecados cometidos desde o princípio do mundo, e quisera poder repará-los com o meu sangue. Finalmente, a cada movimento das mãos, ou dos pés, ou de qualquer outra parte do corpo, tenciono submeter-me à vossa santíssima vontade, desejando que de conformidade com esta se façam todas as coisas. Para que este meu ajuste nunca mais seja violado, confirmo-o e selo-o com as cinco Chagas de Jesus Cristo, e deposito-o em vossas mãos, ó Mãe da perseverança, Maria” (2)

Referências:
(1) Ef 5, 15
(2) Esta fórmula de reta intenção foi feita por São Clemente Maria Hoffbauer, C. SS. R.

(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I: Desde o Primeiro Domingo do Advento até a Semana Santa Inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 101-104)

Santo do dia

Depois de uma horrível tempestade de três séculos, a Igreja finalmente triunfa: assim será com cada alma que suporta pacientemente a provação e mantém sempre a sua confiança em Deus.

 

31 de dezembro: SÃO SILVESTRE - PAPA E CONFESSOR (280-335)


Este Papa dos inícios da nossa Igreja era um homem piedoso e santo, mas de personalidade pouco marcada. São Silvestre I apagou-se ao lado de um Imperador culto e ousado como Constantino, o qual, mais que servi-lo se terá antes servido dele, da sua simplicidade e humanidade, agindo por vezes como verdadeiro Bispo da Igreja, sobretudo no Oriente, onde recebe o nome de Isapóstolo, isto é, igual aos apóstolos.

E na realidade, nos assuntos externos da Igreja, o Imperador considerava-se acima dos próprios Bispos, o Bispo dos Bispos,com inevitáveis intromissões nos próprios assuntos internos, uma vez que, com a sua mentalidade ainda pagã, não estava capacitado para entender e aceitar um poder espiritual diferente e acima do civil ou político.

E talvez São Silvestre, na sua simplicidade, tivesse sido o Papa ideal para a circunstância. Outro Papa mais exigente, mais cioso da sua autoridade, teria irritado a megalomania de Constantino, perdendo a sua proteção. Ainda estava muito viva a lembrança dos horrores por que passara a Igreja no reinado de Diocleciano, e São Silvestre, testemunha dessa perseguição que ameaçou subverter por completo a Igreja, terá preferido agradecer este dom inesperado da proteção imperial e agir com moderação e prudência.

Constantino terá certamente exorbitado. Mas isso ter-se-á devido ao desejo de manter a paz no Império, ameaçada por dissenções ideológicas da Igreja, como na questão do donatismo que, apesar de já condenado no pontificado anterior, se vê de novo discutido, em 316, por iniciativa sua.

Dois anos depois, gerou-se nova agitação doutrinária mais perigosa, com origem na pregação de Ario, sacerdote alexandrino que negava a divindade da segunda Pessoa e, consequentemente, o mistério da Santíssima Trindade. Constantino, inteirado da agitação doutrinária, manda mais uma vez convocar os Bispos do Império para dirimirem a questão. Sabemos pelo Liber Pontificalis, por Eusébio e Santo Atanásio, que o Papa dá o seu acordo, e envia, como representantes seus, Ósio, Bispo de Córdova, acompanhado por dois presbíteros. Ele, como dignidade suprema, não se imiscuiria nas disputas, reservando-se a aprovação do veredito final. Além disso, não convinha parecer demasiado submisso ao Imperador.

Foi o primeiro Concílio Ecumênico (universal) que reuniu em Nicéia, no ano 325, mais de 300 Bispos, com o próprio Imperador a presidir em lugar de honra. Os Padres conciliares não tiveram dificuldade em fazer prevalecer a doutrina recebida dos Apóstolos sobre a divindade de Cristo, proposta energicamente pelo Bispo de Alexandria, Santo Atanásio. A heresia de Ario foi condenada sem hesitação e a ortodoxia trinitária ficou exarada no chamado Símbolo Niceno ou Credo, ratificado por São Silvestre.


Constantino, satisfeito com a união estabelecida, parte no ano seguinte para as margens do Bósforo onde, em 330, inaugura Constantinopla, a que seria a nova capital do Império, eixo nevrálgico entre o Oriente e o Ocidente, até à sua queda em poder dos turcos otomanos, em 1453.

Data dessa altura a chamada doação constantiniana, mediante a qual o Imperador entrega à Igreja, na pessoa de São Silvestre, a Domus Faustæ, Casa de Fausta, sua esposa, ou palácio imperial de Latrão (residência papal até Leão XI), junto ao qual se ergueria uma grandiosa basílica de cinco naves, dedicada a Cristo Salvador e mais tarde a São João Batista e São João Evangelista (futura e atual catedral episcopal de Roma, São João de Latrão). Mais tarde, doaria igualmente a própria cidade.

Depois de um longo pontificado, cheio de acontecimentos e transformações profundas na vida da Igreja, morre São Silvestre I no último dia do ano 335, dia em que a Igreja venera a sua memória. Sepultado no cemitério de Priscila, os seus restos mortais seriam transladados por Paulo I (757-767) para a igreja erguida em sua memória.

MISSAL QUOTIDIANO COMPLETO / EM PORTUGUÊS com o próprio do Brasil edição B - editado e impresso nas oficinas tipográficas do Mosteiro de São Bento / Bahia, 23 de dezembro de 1957. Pág 76.

São Silvestre tinha Roma como pátria. Quando teve idade suficiente para dispor da sua fortuna, teve prazer em acolher os cristãos estrangeiros que passavam por Roma; levou-os para sua casa, lavou-lhes os pés, serviu-lhes a comida e, por fim, deu-lhes, em nome de Jesus Cristo, todos os cuidados da mais sincera caridade.

Um dia chegou a Roma um ilustre confessor da fé, chamado Timóteo de Antioquia. Ninguém se atreveu a recebê-lo; Sylvestre deu-se uma honra e, durante um ano, Timóteo, pregando Jesus Cristo com incrível zelo, recebeu a mais generosa hospitalidade em sua casa. Tendo este homem heróico conquistado a palma do martírio, Sylvestre roubou seus preciosos restos mortais e os enterrou na calada da noite. Mas ele próprio logo foi levado perante o tribunal do prefeito, por abrigar os tesouros do mártir: "Timóteo", respondeu ele, "deixou-me apenas a herança de sua fé e de sua coragem".

O prefeito o ameaçou de morte e mandou colocá-lo na prisão; mas Silvestre, ao deixá-lo, disse-lhe: “Seu tolo, é você mesmo quem, esta noite, dará contas a Deus”. O perseguidor engoliu uma espinha de peixe e morreu, de facto, durante a noite. O medo dos castigos celestiais suavizou os algozes e o heróico jovem foi libertado. Este belo comportamento de Silvestre fez com que fosse chamado ao diaconado pelo Papa São Melquíades, de quem seria eminente sucessor.

O seu longo pontificado de vinte e um anos, famoso por vários motivos, é especialmente famoso pelo Concílio de Nicéia, pelo Batismo de Constantino e pelo triunfo da Igreja. O Batismo de Constantino é adiado para um período posterior por muitos autores; mas testemunhos não menos numerosos e não menos graves situam o Batismo deste grande imperador sob o reinado de São Silvestre, e o Breviário Romano confirma esta opinião.

Constantino, ainda pagão e pouco favorável aos cristãos, cuja doutrina ignorava completamente, foi acometido de uma espécie de lepra que lhe cobria todo o corpo. Uma noite, São Pedro e São Paulo, cheios de luz, apareceram-lhe e ordenaram-lhe que chamasse o Papa Silvestre, que o curaria dando-lhe o Batismo. O Papa, de fato, instruiu o neófito real e o batizou. O reinado social de Jesus Cristo começou; a conversão de Constantino teria a feliz consequência do universo.

Relíquia da caveira de São Silvestre, Basílica de São Silvestre em Roma (Itália)


Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo II

 A sentença da alma culpada no juízo particular  Discedite a me, maledicti, in ignem aeternum, qui paratus est diabolô et angelis eius – “A...